15 novembro 2015

Matando a saudade



Era pra ter sido bom
deixado um gosto de se querer sempre e um pouco
mais

era pra ter acertado o tom
e ouvir o teu silêncio cantando no meu peito
mas

fica tudo sem sentido
enquanto um ama, o outro se esconde
não vou seguir tentando
deixo o tempo a vontade
matando a saudade.

09 outubro 2015

A outra metade da laranja



      Terminado.

      Após muito tempo de enrolação, terminou de ler o livro que acumulava poeira na cabeceira da cama. Só então percebeu a capa amarela, imitação de um classificador antigo com uma etiqueta tão velha quanto, dessas que não devem ser mais encontrada. Vida moderna, soluções eletrônicas para coisas simples. Quando acaba a bateria...

      Percorreu mais um pouco o livro traçando um roteiro diferente do habitual. Informações sobre gráfica, registro no ISBN, tipo de papel. Nisso se deu conta da autora do livro: uma cantora e compositora de uma das bandas mais legais que conheceu nos últimos anos, coisa fina. O livro é tão caótico e delicado quanto as músicas, em alguns momentos não se sabe se é viagem de ácido ou simplesmente falta de atenção na leitura. Volta página. Algo parece ainda estar fora do lugar. Melhor criar contexto: hora de por as músicas pra tocar. Tinha todos os mp3 existentes da banda no HD do computador, mas preferiu arriscar o Spotify. Tava lá, tudo organizado por disco e número de faixa. Isso é estranho, no HD está pela ordem alfabética do nome das músicas. Não importa; DJ, sobe o som (mas não muito porque já passou da uma da matina, o povo em casa tá dormindo e já bastou o alarme da casa ao lado ter tocando algumas vezes essa noite).

      Voltou às páginas. Desenho de dois corações dentro de um liquidificador (chamado de vitamina de amor), pensou na metáfora metalinguística envolvida naquilo. Para misturar era preciso bater e destruir, ia ter dor envolvida para que houvesse um envolvimento maior de cada parte. Um misturado ao outro. Ia ter mais dor quando fossem separar. "Estar perto requer outros dons", soa a música.

      Lá pelo final, nas páginas negras com letras brancas, o nome de todo mundo que contribuiu para que o livro existisse. Financiamento coletivo via internet. Vida moderna, solução eletrônica para coisas (nem tão) simples. E precisa bater a meta. No meio de tanta letrinhas, encontrou seu apelido lá pelo final. Bateu aquele orgulhinho besta. Bateu também a curiosidade de saber o nome das pessoas que ajudaram, quem viajou na maionese junto. Lá pela metade se deparou pelo nome da única pessoa que veio lhe falar da banda sem que tivesse enviando uma música de degustação antes. Não tinha pensado nisso antes de correr a lista, mas nada fora do normal. Daí então começou a tocar uma música: "Uhhhh is that a ufo or a shooting star?". E lembrou que logo depois vinha "I'm travelling on mayonese".

      Viajando na maionese lembrou do único show da banda que assistiu até hoje. Circo Voador, RJ. Primeira vez na cidade. A companhia parece ser a melhor para a ocasião, cantaram juntos, sorriram juntos, quase choraram. Abraços, beijos. Quantos sorrisos. E parecia que todos os carinhos e planos futuros eram perfeitos. "I don't believe in fairy tales / But i'm stuck in one"+"Mas ninguém muda ninguém" = tudo errado. A ex-companhia não fazia mais parte da sua vida. Nem das pessoas que contribuíram para o livro.

      Melhor assim. Quando uma relação envolve músicas maravilhosas e a vaca vai pro brejo, não tenha dúvidas: fique com a banda.

07 outubro 2015

Em busca

Em meio a madrugada, olhos pesados
Sono trocado, tempo atrasado em passar
Mas a vida continua sem pensar

Enquanto dormem, todos nem imaginam o que acontece
com aqueles que não se confortam no travesseiro
e pedem pro inferno passar ligeiro

Cada um escolhe os fantasmas para se assombrar
não há redenção até o amanhecer distante
nessa jornada do anti herói errante

Valsam ligeiros pelas mentes,
demônios empilhados na cabeceira
o vazio ocupando o espaço de todas as maneiras

A que horas você chega?
Quero deixar isso tudo pra trás
E seguir buscando algo que me dê paz.

25 setembro 2015

Maré vazia

Hoje nada teve graça
uma folhinha arrancada jogada no lixo
zero a esquerda de outros zeros
um tempo sem sentido, perdido
um abraço sem calor
um cuscuz sem fumacinha (e manteiga)
qual a graça de um dia
que não soube se fazer presente
enquanto podia?

Foi tudo tão pouco
que não serviu pra coisa alguma
e quando chegou a noite,
o que é que havia?
Apenas uma sensação vazia
e eu perguntando o porque de 24h serem tão inúteis
mas me ocorreu um verso
tentei fazer poesia
a folha branca espera cansada
o peso da pena torta
então me dei conta
de que hoje tudo daria em nada.

11 setembro 2015

Selfie

Brise-se
e de leve leve-se
sem pressa, sem forma, sem ruído
tendo sentido
tudo que lhe tem
sorrido


Transborde-se
de pouco em tanto
do quando em sempre
tendo amado
todos que lhe dão
afago

26 julho 2015

Toda Poesia


Inverno
é tudo que sinto
viver
é sucinto

Paulo Leminski



      Domingo, dia cinza, inverno invadindo o quarto pela janela. A cama parece o único lugar que resta no mundo. O aconchego, o abraço, tá tudo nela, só falta ela fazer cafuné. Me estico todo pra pegar um livro na cabeceira, o mesmo que me acompanha para quase todos os lugares nos últimos 3 anos: Toda Poesia, do Paulo Leminski.

      Lendo os versos do bigodudo curitibano, me lembrei de quando comprei o livro. Ano de 2012, viagem de férias. Depois de muito tempo sem viajar, por vários motivos que hoje parecem mais desculpas para evitar o desconhecido, planejei meus dias de férias (todos eles e mais alguns, na verdade) para desbravar o mundo. Acabei me descobrindo.

      Desse dia em diante passei a querer viajar mais, conhecer mais pessoas, mais lugares. Isso tudo para me conhecer melhor, para me tornar alguém mais atento e empático com o que me rodeia. Brasília, São Paulo, algumas cidades de Minas, Vitória, Rio de Janeiro, Curitiba, Manaus. Cidades bem diferentes, com costumes diferentes e ainda assim cheia de pessoas com atitudes iguais. Calor, frio, simpatia, indiferença. Encontrei muito pelo caminho, anseio por encontrar mais.

      E foi entrando numa livraria em São Paulo, num mês de julho em que experimentava pela primeira o inverno paulistano, que me deparei com aquele livro laranja, num tom tão berrante que quase dava pra ouvi-lo grita "Me leve!". Levei. E também estou sendo levado, seguindo um caminho que não faço a mínima ideia onde vai dar.

      No entanto, o livro que tenho comigo não é o mesmo que comprei anos atrás. Este foi deixado como presente pelo caminho, depois de uma tarde de chuva, café e um apartamento bagunçado, onde ouvi o livro me gritar "Me deixe". Entendi que era um pedido do próprio Leminski, afinal estava em Curitiba. Não me fiz de rogado, nunca me apeguei a livros. Acho que eles são livres e desejam correr o mundo tanto quanto eu.

      Depois de um tempo me peguei com vontade de ler tudo novamente, Leminski hoje me é tão importante quanto Vinícius de Moraes me foi na adolescência. Fui na livraria e comprei outra edição. Novo exemplar, mesma sensação: enquanto houver inverno e Leminski, não vou me sentir só.

      Nem completo.

      Talvez seja hora de arrumar a mala.

30 junho 2015

Pedido

Acompanha está carta um presente
Que embrulhado em abraços
E enfeiado com alguns sorrisos
Haveria de ser entregue pessoalmente

E do destino espera-se tudo
A alegria, a dor
A surpresa, o susto
O inesperado chega pra todo mundo

O presente chegará ao destino
Numa embalagem de papel e durex
Que algum estranho a entregará
E isso, no fim, não faz sentido

O medo destrói tudo, não deixa margem
E lhe peço que ouça Guimarães Rosa
Para descobrir o que a vida nos cobra:
Coragem, meu bem! CORAGEM!

09 fevereiro 2015

Beira mar

Veja bem menina
A vida tem dessas coisas
de rir, de chorar,
de dizer que não dá pra amar mais
E assim os dias
não cansam de passar

Recebe bem menina
O que lhe traz de sereno o mar:
Ondas nas pernas a bater
Brisa nos cabelos a soprar
Areias pros pés mover
Tempo para pensar.

Guarda bem menina
só o que encontrar de bom
deixa vir o que vier
e chore quando quiser
que o coração ama sempre puder
seja lá quem for